A Hermininha

Cabeçais foi sempre uma localidade respeitada quilómetros em redor pelo excelente carácter das suas gentes. Dos moradores em geral.

No entanto, já lá vão uns anos muito largos, vivia nesta bela terra um indivíduo muito corpulento e forte que poderia considerar-se um “sem abrigo”, não fora a generosidade de uma senhora que, nesta bela terra, era possuidora de uma espécie de albergaria que lhe proporcionava ao indivíduo em questão, quase de graça, cama, mesa e roupa lavada. O indivíduo era o Manuel das Rochas, considerando as Rochas o leste de Fermedo.

A albergaria da senhora era constituída por várias moradias e o Manuel das Rochas dormia no rés-do-chão de uma delas. Durante o dia, o Manuel das Rochas executava pequenas e grandes tarefas ao serviço dos moradores e, quando não tinha que fazer, deambulava pela freguesia e arredores a pedir uma esmolinha e a maioria das pessoas abordadas nunca lha recusavam. Havia por sinal, muitos mendigos errantes, naqueles tempos recuados.

A higiene do Manuel das Rochas deixava muito a desejar, como é de calcular, mas este Manuel das Rochas era dotado de um carácter meigo e solidário e, por isso, estimado por todos.

Exatamente, talvez, pela falta de higiene, o bom do homem contraiu uma série de infeções nas pernas, que se tornaram inchadas e reluzentes e, ao fim de algum tempo, cravadas de orifícios com uma larva dentro de cada um.

Havia, por essa altura, e decerto, nascitura na localidade de Cabeçais, uma menina, já adolescente, dotada de um temperamento a todos os títulos adorável. E era a Hermininha, e a Hermininha Lima cismou em que havia de tirar as larvas às pernas do Manuel das Rochas, e, se assim pensou, mais depressa o fez. Mandou-o sentar numa pedra, muniu-se de uma pinça, de algodão em rama e água oxigenada e, com uma determinação notável, retirou uma a uma as milhentas larvas das pernas do Manuel das Rochas.

O facto deu brado longe. A Hermininha morreu ainda jovem, depois de ter casado e deixando viúvo o marido e órfãos três crianças: um rapaz e duas meninas que, hoje, são adultos muito respeitáveis e bem acompanhados nesta vida.

Dizia a Doutora Maria Henriques Oswald, que é autora de alguns belos livros e que foi professora de Moral, no liceu da Rainha Santa Isabel: “É nas pequenas coisas que se veem as grandes almas”.

Achou-se que este gesto da Hermininha não se devia esquecer e, por isso, se passa à imprensa regional. E, ainda que as folhas do jornal, esvoacem desprezadas pelas valetas, este registo lá fica. E hoje, com a digitalização, mais do que nunca. Mafalda Fernandes

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