CARLOS BARBOSA
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2021, o ano homeostático
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OPINIÃO | Lidamos com a nossa indubitável fragilidade
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Chegamos ao fim de mais um ano. Dirão alguns que é o fim daquele ano. Diria que foi o ano que nos fez lidar bem de perto com a nossa indubitável fragilidade. O todo poderoso ser, subjugado sem apelo nem agrado. Não sou, contudo, dos que acreditam que este ciclo tenha produzido uma necessidade na condição humana, que a leve a criar uma nova ordem na forma que lidamos com o mundo. Acredito sim, que o que existirá, serão apenas pequenos ajustes à nossa forma de viver, que serão consequência das alternâncias da vida. Não acredito ainda que este ano que agora termina, tenha tido o poder de alterar a nossa forma de lidar com os outros. A natureza humana não mudará. Os mesmos dramas, os mesmos vícios e ambições. Os mesmos valores, embora que com uma escala diferente. Mas apenas para aqueles que foram capazes de incorporar os ensinamentos que tão frescos ainda por aí vagueiam. Este foi o ano que nos convocou à suspensão do tempo e até do nosso próprio pensamento. Foi o ano da paragem. Foi um ano que nos impulsionou a mudarmos de nós, a escolher outro eu. Foi ainda o ano que nos empurrou para um medo de pensar o futuro. Mas há paragens que só existem para alcançarmos a normalidade. Para retornarmos à normalidade. Quase tudo se manterá no seu normal. Todos nós somos capazes de, com alguma rapidez, elencar os próximos movimentos. Apenas estamos em pausa. Virá a vacina, chegarão os apoios comunitários. Haverá aumento dos níveis de desemprego, diminuição do poder de compra, algum aumento da criminalidade. Mais carências e dificuldades na classe média. Tudo se repete. A única dimensão que teremos mais dificuldade em acertar é a dimensão temporal. Por quanto tempo teremos estes cenários. Tudo gira e tudo se organiza de forma a alcançar um novo equilíbrio, mesmo que desequilibrado. Diria que este universo social se transporta para uma dimensão biológica e alinha-se através de uma regulação homeostática. Esta é vista como a capacidade que alguns seres vivos possuem de manter todas as suas funções equilibradas, independente das alterações que se verificam no seu meio envolvente. É o processo pelo qual um organismo consegue a constância do seu equilíbrio. Pois é nisto que acredito que a sociedade será, nestes próximos tempos. A força do reequilíbrio dinâmico. Este será o ano homeostático. Todavia, acredito que se abriram portas para algumas novas tendências que são já bem visíveis. Apostaria em algumas, não querendo ser exaustivo: • Acredito na exponenciação da inovação/investigação. Será cada vez mais, o motor do nosso desenvolvimento. O grande contributo que esta pandemia produziu, foi o de empurrar toda a comunidade científica para uma maior interação em rede e promoção da criação do cérebro coletivo. Nunca como agora, esta classe se revestiu de tal unidade. Teremos mais sintonia. • Maior interesse por tudo que traz mais prazer. Já não basta possuir. Era já uma tendência, mas este contexto fez multiplicar. Sentimos que a vida só faz sentido se nela existir um propósito. A paragem a que todos fomos impelidos a fazer, levou-nos a uma introspeção que gerou essa necessidade de propósito. Para que nos serve viver? • Haverá uma maior tendência de produções especializadas para consumos diversificados. Microproduções por micro produtores. Cada um de nós tenderá a ser um pequeno produtor que atingirá um nicho particular. • A digitalização do negócio será mais do que uma consequência, um catalisador de uma nova economia de subsistência. Depois do advento, a consolidação de uma classe de nómadas digitais que casam com propósitos de liberdade e prazer, mas altamente sofisticados e empreendedores. Todavia, acredito plenamente que este será o ano zero de um ciclo altamente próspero. Neste ciclo o mundo será bem melhor para a grande maioria de nós. Entraremos numa nova Belle Époque. Saibamos, cada um de nós, encontrar o trilho que nos permita chegar a esse mundo cada vez melhor. Mas para que isso aconteça, não podemos deixar o futuro à aleatoriedade da sorte. Teremos de nos imbuir de um espírito de "eu vou fazer que isso aconteça" por oposição a um espírito de "eu espero que isso aconteça". Sejamos otimistas ativos, nunca crentes passivos!(texto publicado na edição impressa do RODA VIVA jornal em 2021.01.14)
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